O que o diagnóstico muda na minha vida?

by - dezembro 27, 2017





Em uma palavra: Reconstrução.

"Sentir que não é igual às pessoas, sentir e descobrir que realmente é diferente das outras pessoas, pode ter um significado benéfico, mas é depressivo."  

Quando eu era adolescente, 16 anos, ninguém que eu conhecia, gostava e entendia mais de filmes do que eu. Todos os finais de semana eu locava várias fitas, a locadora era o ambiente que eu mais desejava estar. Eu assinava a revista Set e comprava os catálogos anuais, sabia tudo sobre os meus filmes prediletos, ano de lançamento, diretores, atores e as frases de muitos deles que eram utilizadas muitas vezes na minha comunicação, às vezes, ficando sem sentido no meio da minha fala. Mas era assim que eu tentava entender o mundo, que tentava aprender sobre comportamento e o que fazer em certas situações. Passei a querer muito ter uma locadora, desenhei o projeto todo no papel e fiz um sistema de computadores, naquela época isso não existia, computadores eram muito caros e quase ninguém os utilizava como terminal, mas na minha mente tudo era possível.

"O autista trabalha com muitas informações ao mesmo tempo, e às vezes não consegue fazer nada, pois o cérebro trava. Em algumas situações ocorre o imaginário, uma ideia brilhante, no qual ele fica remoendo dentro de sua cabeça, simulando situações. A pessoa normal nem sempre consegue se desligar do mundo físico, e quando se concentra, geralmente analisa apenas um tema. O autista deixa o cérebro funcionar sem parar, visando uma solução para o seu problema ou dúvida, a pessoa normal larga essa tentativa depois de certo tempo, mesmo que não encontre a solução. A não solução é uma afronta à mente autista. Tudo tem solução, seja trivial ou não, mas tem."
  
O desejo de fazer algo que fizesse a diferença foi sendo esquecido, já que nada na minha vida deu muito certo, foi embora a alegria e o entusiasmo que agora retornam mais vivos.

Entender as minhas necessidades é de extrema importância, entender porque eu faço o que faço também.  Eu não entendia porque não gostava de sair, não gostava de ambientes com muitas pessoas e muito barulho ou porque passava mal em algumas dessas situações com direito a desmaios.

As pessoas me diziam que para ter um relacionamento eu precisava sair, mas eu nunca senti necessidade de ter um relacionamento e nunca consegui me apaixonar, pelo contrario eu enjoava da pessoa e era um esforço enorme estar junto. 

Tentamos entender os fenômenos do sentimento e criamos solução para as nossas necessidades e com o tempo nos sentimos normais, mas a dificuldade de entender situações e a fisionomia das pessoas é algo que pode gerar ações de risco ou desconfortáveis.

Quando a gente estuda informações sobre SA começa a fazer uma autoanalise e acaba percebendo que pode estar dentro do diagnóstico de autismo, então, imaginamos que é loucura, devaneio ou uma desculpa. Mas as características começam a se encaixar como um quebra-cabeças, pensamos em todos os eventos desgastantes, pensamos no relacionamento familiar e em todas as relações sociais, desde a infância, a dificuldade de se reconhecer no espelho (durante muito tempo eu fiquei cismada porque achava que eu não era a mesma pessoa que aparecia nas fotos, ainda acho, mas agora tenho uma resposta) e vem a noção de que talvez não sejamos "normais", nos damos conta de que muitas incomodações acontecem por culpa nossa. É uma batalha interna, do ser ou não ser.
 
Há dois anos penso essas coisas sobre mim e queria desesperadamente que alguém me dissesse: "Você não está louca". O Victor Mendonça do Mundo Asperger me disse: "Eu entendo a tua angustia..." E essa foi a coisa mais importante que alguém me disse durante todos esses anos, me deu força e coragem para seguir em frente e encarar o diagnóstico.

Não vejo o diagnostico como uma dádiva e quando a neuropsicóloga me deu o laudo, eu fiquei paralisada. Definitivamente não é um dom ser Asperger, é algo que irá me atropelar pelo resto da minha vida, mas ter a consciência da minha maneira de pensar, utilizar da melhor maneira possível a minha forma de viver e reverter tudo isso para ajudar outras pessoas é algo que ameniza e da sentido a todo o sofrimento que já vivenciei. "É fazer valer a dor do mundo".

Continuo sendo a mesma pessoa, agora com mais consciência de quem eu sou, exigindo mais respeito e entendimento de todos pela neurodiversidade. Tenho alguns projetos em mente e um compromisso de fazer a diferença na vida das outras pessoas, mantendo sempre a sinceridade e a honestidade tão características da minha personalidade.

Trechos retirados do livro: Seu namorado é estranho? André Rugenski. 


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