Quando eu era criança eu não fazia ideia que eu era diferente. Sabe como eu descobri? Com as pessoas me tratando de maneira diferente.
O que eu quero dizer com isso? É que eu percebo. Desde que entrei para o colégio comecei a perceber a grande diferença entre eu e os outros, era como se eu soubesse algo que eles não sabiam, mas eu não fazia ideia do quer era e por incrível que pareça, isso me mantinha forte a respeito das coisas que eu precisava enfrentar.
A minha forma de tentar fazer amigos era um pouco estranha. Eu decorava a fala de uma novela na qual uma personagem falava: "Vai catar lata". Então, cada vez que uma criança se aproximava eu falava essa frase. Pessoas com autismo repetem frases, porque não sabem se expressar. Eu como Asperger adulta tenho mais facilidade de encontrar essas palavras e já sei me expressar muito bem, mas nem sempre foi assim, então agora posso explicar um pouco sobre isso.
Eu sempre gostei de estar perto de pessoas e de ter amigos. Não posso acreditar que alguém queira realmente ser deixado sozinho. O que incomoda é que as coisas nem sempre dão certo, sentimos muito quando as pessoas demonstram desinteresse em nossos assuntos, porque geralmente a gente se esforça muito para ouvi-las, esperamos que acabem de falar sobre suas coisas, mas a gente também gostaria de conversar sobre as nossas coisas. No final, acabamos nos acostumando com a solidão, sem sequer perceber como isso aconteceu.
Quando eu ouço alguém me tratar como se eu amasse ficar sozinha, isso me faz sentir solitária demais. Sinto como estivessem me dando um gelo de propósito. Isso é algo que tem sido corriqueiro nos últimos tempos porque a minha conexão com pessoas aumentou de certa forma. Algumas pessoas ficam muito tempo sem falar comigo, quando retornam elas vem acompanhadas de uma enxurrada de informações sobre suas vidas, coisas das quais eu não participei, me sinto mal por entender que eu só sou uma boa ouvinte, como um objeto virtual.
A vida cotidiana é repleta de situações difíceis, ás vezes, a emoção fica congelada dentro da gente e noutras vezes falamos sem parar, gritamos e falamos palavrão. Sozinhos, quando não temos que pensar nos outros e em nada mais, exibimos nossas expressões naturais, o que durante muito tempo me fez pensar que eu era louca. Porque eu conseguia sentir tantas coisas quando estava sozinha?
Lembramos de muitas situações da nossa vida, o problema é que são lembranças desordenadas, elas se repetem na nossa cabeça como se tivessem acabado de acontecer. Quando isso ocorre, as emoções que sentimos da primeira vez voltam com a mesma intensidade. Geralmente são memórias ruins, coisas que a gente não gostaria de relembrar, não desse jeito, podemos congelar, tremer ou entrar em pânico.
Eu percebi isso mais claramente em mim quando comecei a fazer terapia e tinha sensações ruins depois, quando estava sozinha. Depois eu fiz um tempo de Constelações Familiares, foi um tempo dificil porque eu não sabia do autismo e não sabia o que estava acontecendo comigo. Foi um grande erro da minha parte ter me exposto daquela forma, sem acompanhamento de um bom psiquiatra ou neuropsicólogo, eu poderia ter tentado o suicídio, fiz planos diversas vezes e de diversas formas, tamanho era o meu sofrimento. Em vez disso, eu me agredia fisicamente e o que realmente me salvou foi estar morando com os meus pais, eu jamais iria expô-los dessa forma.
A questão do erro é muito complicada para a gente, pode ser um erro pequeno, mas não para de nos perturbar. E se uma pessoa que a gente cria afeto e tem respeito pelo que a pessoa nos fala, aponta nossos erros de maneira critica, é terrível. É como se o céu e a terra tivessem trocado de lugar.
Então, minha grande esperança é poder ajudar um pouco, explicando do meu jeito, o que acontece na mente de algumas pessoas que são como eu. Também espero que você possa se tornar um amigo melhor para alguém com autismo.
5 coisas que é legal saber sobre o pensamento autista:
1. Não suponha que cada palavra que dizemos é aquilo que pretendíamos.
2. Meus sentimentos são bem parecidos com os seus.
3. Nos sentimos abandonados pelo mundo inteiro.
4. O conceito do que é engraçado para nós é diferente do que é para vocês.
5. Temos a sensação de que o nosso corpo não nos pertence e ele realmente escapa do nosso controle.
O que me faz pular, de Naoki Higashida